publicado em 28/10/2025
Por Arthur Francisco Fungaro Stringheta
A Reforma Tributária brasileira tem como um de seus principais fundamentos a neutralidade fiscal — conceito que busca reduzir ao máximo a influência dos tributos sobre as decisões de consumo e sobre a organização da atividade econômica.
Em tese, o novo sistema foi desenhado para garantir que, independentemente das estruturas societárias adotadas, dos contratos firmados ou das nomenclaturas utilizadas, o encargo tributário permaneça estável. Isso tende a limitar estratégias de planejamento tributário que visem alterar a carga fiscal por meio de modelagens empresariais complexas.
De acordo com a Resolução nº 60/2021 da CVM, a securitização consiste na aquisição de créditos para utilização como lastro na emissão de títulos.
Na prática, empresas que possuem créditos a receber no longo prazo os alienam a uma securitizadora, com deságio, para antecipar valores e reforçar o caixa. Essa antecipação permite ampliar operações e realizar novos investimentos.
Embora seja uma estratégia financeira, a securitização também é utilizada para otimização tributária, já que o deságio na venda dos créditos pode ser considerado despesa financeira dedutível na apuração do Imposto de Renda.
Entretanto, essa vantagem depende do equilíbrio entre os encargos tributários incidentes sobre as securitizadoras — algo que deve ser reavaliado à luz da Reforma Tributária, que alterará a tributação dos serviços financeiros.
Atualmente, a atividade de securitização não está sujeita à cobrança de ISS, por não constar na lista anexa à Lei Complementar nº 116/2003, entendimento já consolidado em decisões judiciais.
Já a Instrução Normativa nº 2.121/2022 determina a incidência de PIS/Pasep e Cofins, sob regime cumulativo, com alíquota total de 4,65%.
A base de cálculo é a diferença entre o custo de aquisição dos direitos creditórios e o valor recebido pela securitizadora, permitindo a dedução das despesas de captação de recursos.
Tratamento sob o novo modelo (IBS e CBS)
Com a Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) para o setor financeiro, a base de cálculo da securitização passa a considerar:
o desconto aplicado na liquidação antecipada do crédito;
a dedução das despesas de captação de recursos;
e outras despesas operacionais, como emissão, distribuição, custódia, registro, formalização, administração e atuação de agentes fiduciários.
Na prática, há grande semelhança entre a base de cálculo anterior e a nova, mas agora há maior detalhamento das deduções possíveis.
A incidência do IBS e da CBS seguirá a alíquota geral aplicada aos serviços financeiros, que será definida de forma a preservar a carga tributária atual sobre operações de crédito.
Ainda assim, há expectativa de que a nova alíquota seja ligeiramente superior a 4,65%, em razão da inclusão de encargos não recuperados pelas instituições financeiras.
Sob a ótica de quem cede o crédito, a Reforma traz uma novidade relevante: será possível creditar IBS e CBS sobre o valor do deságio aplicado ao título.
Atualmente, o deságio pode ser deduzido apenas no IRPJ e na CSLL.
Com o novo modelo, também será possível aproveitá-lo como crédito dos tributos sobre o consumo — o que aumenta a atratividade da securitização como instrumento de gestão financeira e tributária.
Ainda é cedo para medir com precisão os efeitos da Reforma Tributária sobre as operações de securitização. Contudo, a semelhança entre as bases de cálculo do sistema atual e do novo regime indica que o impacto tende a ser limitado.
O ponto positivo é a possibilidade de creditamento sobre o deságio, que amplia os benefícios fiscais dessas operações e pode manter a securitização como uma alternativa eficiente de planejamento financeiro para as empresas diante do novo cenário tributário.